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terça-feira, 28 de abril de 2020

...do desassossego...


 
 "Sinto o tempo com uma dor enorme. É sempre com uma comoção exagerada que abandono qualquer coisa.  [...] - sim, mas as coisas pequenas da vida, quando as abandono e penso, com toda a sensibilidade dos meus nervos, que nunca mais as verei e as terei, pelo menos naquele preciso e exacto momento, doem-me metafisicamente. Abre-se-me um abismo na alma e um sopro frio da boca de Deus roça-me pela face lívida.
 O tempo! O passado! Aí algures, uma voz, um canto, um perfume ocasional levantou em minha alma o pano de boca das minhas recordações.... Aquilo que fui e nunca mais serei! Aquilo que tive e não tornarei a ter! Os mortos! Os mortos que me amaram na minha infância.
Quando os evoco, toda a alma me esfria e eu sinto-me desterrado de corações, sozinho na noite de mim próprio, chorando como um mendigo o silêncio fechado de todas as portas."

Fernando Pessoa, in «O livro do desassossego»

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