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quarta-feira, 27 de fevereiro de 2019

I - Tu não és...



[...]
Tu não és mulher.(...)É quando falo de ti que as palavras te chamam fêmea, e as expressões te contornam de mulher. Porque tenho de te falar com ternura e amoroso sonho, as palavras encontram voz para isso apenas em te tratar como feminina.
Mas tu, na tua vaga essência não és nada. não tens realidade, nem mesmo uma realidade / só / tua. Propriamente, não te vejo, nem mesmo te sinto.´És como que um sentimento que fosse o teu próprio objecto e pertencesse todo ao íntimo de si-próprio. És sempre a paisagem que eu estive quase para (poder) ver, perdido num eterno Agora para além da curva do caminho. O teu perfil é não seres nada, e o contorno do teu corpo irreal desata em pérolas separadas o colar da ideia de contorno. Já passaste, e já foste, e já te amei - o sentir-te presente é sentir isto.
Ocupas o intervalo dos meus pensamentos e os interstícios das minhas sensações. Por isso eu não te penso nem te sinto, mas os meus pensamentos são / opiais/ de te sentir, e os meus sentimentos góticos (?) de evocar-te.
[...]
Bernardo Soares( heter.  de F. Pessoa), in Livro do Desassossego

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